segunda-feira, 28 de março de 2011

O despertador


Abriu os olhos como quem grita. Odiava o barulho do seu rádio-relógio, por isso acordava dez minutos antes do alarme soar, metia a mão nos botões de cima do objeto e censurava qualquer reação daquele aparelho diabólico, evitando um dos elementos constitutivos de seu drama matinal. 

Um preguiçoso “puta que pariu” foram as suas primeiras palavras do dia. Seu olhos inchados e tristes, como de praxe, refletiam algo da noite passada que ele nem podia lembrar. Um odor amargo em seus pensamentos, dores imagéticas saltavam frente aos seus olhos, tudo desfocado, sem um mínimo enquadramento, sem um pingo de lucidez.


Não queria chorar, achava a coisa mais brega do mundo. Estava decidido a não mais fazer isso e ficaria firme em sua decisão, ao menos em quanto estivesse sóbrio. O choro era uma fuga medíocre, pensava.

Sentia uma imensa raiva daqueles que faziam de suas desgraças palco para brilharem em frente aos infelizes desavisados que julgavam-se alegres sem nem saberem quaisquer motivos realmente relevantes para isso, além do quê, muito bem que não existe felicidade às sete horas da manhã. 


Suas promessas, seus fantasmas, seus rancores eram partes de uma armadura pesada que sempre se potencializavam com o nascer do sol. Só ele sabia disso, só ele saberia, era uma escolha que julgava virtuosa, talvez a única da sua vida. Por isso, mesmo com dor, permanecia calado perante aos outros. Diante do incomodo, ele refletia que embora tivesse a  certeza de que os responsáveis por suas angustias e desilusões eram todos que o cercavam, ninguém jamais poderia ser responsabilizado individualmente.

Estava confuso, não era anormal. Levantou-se calmamente e foi até o banheiro, pegou sua escova de dentes e apertou o tubo de creme dental que só minguava um resto de pasta já seca. Enquanto os movimentos contínuos da mão esquerda pressionavam a escova nos dentes amarelados por conta do café e do cigarro, urinava no vaso e respingava no chão, ao passo que retorcia seu rosto para contemplar seu reflexo no espelho.

Era o único momento que se achava bonito, com seu rosto carregado de sono, preguiça, tristeza e raiva. Um charme de melancolia e solidão que embaçava sua imagem no sujo e trincado espelho do banheiro, recolhido em seu prego naquela parede úmida, torto, pequeno, com bordas simples de cor alaranjada.


Um espelho vagabundo, só, identificado com a miragem de sua face. Acompanhado somente pelos fungos que habitavam o cimento da pia e daquela imagem, daquele reflexo adjetivado por pedras e tropeços de horas vindouras e de uma madrugada que não voltaria mais.

Ele jogou água no espelho, lavou as mãos, voltou para a cama e dormiu novamente. 


Acordou do pesadelo.


Wescley P.

domingo, 27 de março de 2011

Segundo Manifesto Mómintiriano: Os alquimistas estão chegando!

E de dentro das profundezas do caos, das luzes reluzentes da putaria, dos raios relutantes da poesia e do ideário comprometido com a metodologia do “fazer nas coxas” podiam-se ouvir os gritos estridentes de músculos cerebrais, muito mais atrofiados que o ego, que colocavam no paredão uma anti-instituição ilibada no mais alto conceito eudorico-paraguarassuense de altas prosopopeias revolucionárias em conceitos metafóricos, esquerdóides e megazóides. Absurdo!

Haviam aberto a caixa de Pandora! O conselho de anciões colocava em xeque o compromisso revolucionário da patota solitária afirmando que todo o seu quadro era, um tanto, individualista. Era a ditadura, mais dura do que dita. E diziam ainda que o coletivo unitário gritava uníssono para reproduzir impropérios e heresias sobre as sagradas escrituras de "O Capital".

Tempos difíceis... Super-heroínas fechavam ruas sozinhas e sozinhas construíam o templo sagrado de barbudos bem mais cabeludos que nossos pelos pobres e desiguais pregados em nossa face cheia de cravos. Ora, quem seriamos nós a enfrentar os históricos e os folclóricos, os presentes, os ausentes, os passados, os mal passados, os bem presentes e mais e mais? Era a barbárie.

Uma execução e um vislumbre imediato: Goela a baixo enfiaram um gole de Pitú e a certeza da inquisição de nossos pares "Id e superego" por soldados contemporâneos a nós, no templo profano do anti-caos onde, paulatinamente, substituíam o pote de preservativos por balinhas de hortelã. Era a reorganização lúdica, propositiva, cheia de coletivos sufocados por homens e mulheres igualmente sós, com suas caras de chibatas peculiares, gotas do que estava por vir desde esse dia fatídico. Ora, uma profecia talvez.

Em uma reunião insone, nós mómintirianos, acabamos por invocar o espírito de Clodovil e ao nos encontrarmos com o Mestre dos Magos percebemos que essa crise de imagem era uma dádiva nunca vista antes na historia desse País! Protesto, protestantismo, pensei, digo, pensamos. Escrevemos 25 teses em 140 caracteres... cordeliramos e chantarchargeamos enquanto tirávamos tirinhas da cachola alheia. Afinal, seriamos nós o elo perdido? Aquele pedaço onde pós-modernistas e marxistas se encontram? Seria a Mó Mintíra a materialização mais fiel da contradição? Sim, não, talvez.

Unanimidade, ninguém nos queria! Percebemo-nos com um poder descomunal em mãos, alquimistas responsáveis pelo fim da Burguesia a qualquer momento. Uma farofa sem farinha, um sindicato sem sede, um baião sem feijão, uma lombra sem maconha! Crise, crise, crise!

Puta falta de sacanagem essa safadeza oculta – pensei, lembrando de minhas principais influências dos últimos tempos. Os movimentos sociais não ficavam tão eufóricos desde o lançamento de “É o Tchan na Selva”. Comparavam-nos com João Kleber, Che Guevara, José Paulo Netto. Vimos nossa barba molhada por uma bebida ruim e que dava dor de cabeça, alguns chamavam de cerveja, mas em seu rótulo estava escrito “Kaiser”. Claro! Eureca! Morreu Maria Preá! O ícone dos mandatários, das stalinetes, dos Secretários de Trabalho e Desenvolvimento Social ligados à clubes de Futebol de baixo calibre.

Não havia deputado estadual careca que desse jeito, "mexeu com a Xuxa, mexeu comigo". As constantes explicações semânticas, lingüísticas e sintéticas desse fenômeno pseudo-artístico revelaram o atraso junto a nossa língua-mãe e, como filha da puta que somos, não sabíamos perceber sequer suas melhores qualidades, como a fina ironia perante as grossas entranhas dos grandes, poderosos e virtuosos militantes do mundo melhor. Era muita mágoa, biquinho e beiços aflorados por não serem chamados para uma festa pobre onde apenas um bêbado cantava a "dança do jumento" para a bela lua.

Contemplamos quanta sapiência havia ali e não mais adiantava fugir para as colinas. Ele avisou: é cilada, Bino! A patrulha da história e do saber enviesado fazia uma coalizão com Mister Stalin e o Bloco do anarco-democratismo a fim de proibir todo e qualquer ato que lembrasse o comercial do leite de cabra. Seria mais um sinal para o que estava por vir.

Machista! Homofóbico! Governista! Torcedor do kanal! NÃO, aí NÃO! Atitudes haveriam de serem tomadas, atitudes radicais, vide os esqueitistas de Malhação! Somos nós a coisa mais unânime, séria e coerente desde o Furacão Katrina! Somos nós os responsáveis pelo questionamento ao profeta Althusser. Somos nós que confeccionamos as carteirinhas do fã-clube do Falcão. Somos históricos, referências. Sinalização para o penhasco do endonismo-materialista-dialético.

Evitamos acidentes e fizemos de propósito. Aqui todos se candidatam, todos votam e todos se elegem. Adocicamos a vida com um pote de brigadeiro e um litro de vinho São Braz. Somos o singular mais pluralizado que se pode ver no Velho Oeste e não tem exame de DNA do Ratinho que possa detectar a transcendência da visão enigmática que Luizim da Milhã - em saudosa memória - quando pode nos brindar ao parafrasear Bezerra da Silva: Malandro é Malandro e Mané é Mané. Entre Bezerras da Silvas e Bezerras do Cão vamos alimentando a fome dos pobres diabos angelicais em suas poses e títulos. Do Alvaro Wayne ao Montese, do Itapery ao Tabapuá, libertários etílicos nas ruas esburacadas!

A Mó Mintíra Pictures resolveu xingar muito no twitter. Combater o que chamamos de Pedagogia da Superficialidade, onde as obras acadêmicas transformam-se em sinonímia da Ficção Científica atual e a cooptação ideológica perpassa pelo cheiro no cangote, tão eficaz quão os anticorpos de um jumento quee não gripa no calor de Senador Pompeu.

Vamos fazer um filme. Jogar as cartas na mesa, mostrar porque o diabo mora no Pão-de-Açúcar, porque queremos transformar Guaramiranga em um Único Bar do Odilon, porque combatemos o poder que quer lutar pela redução da jornada de salário e vamos à luta contras as comissões de formatura que investem nas festas o valor financeiro e simbólico inversamente proporcional ao que investem na formação.

Dane-se! Óbvio, preferíamos assistir o filme do Pelé! Invadimos a sala do “Nós” e nos deparamos com tantos “Eus” que foi o jeito buscar uma solução em outro lugar. Sem câmera, sem lenço e sem documento fomos para as letras. Um alfabeto todo para formar palavrões, criarmos factóides típicos da comédia do óbvio (de novo) lulante, como um Tiririca deputado da base do governo democrático e populista que tudo de bom faz, nada de ruim traz e nada sabe e nada ver. Abestados do mundo, uni-vos!

O movimento MóMintiriano se fortaleceu e se movimenta na rede! De um lado para o outro, se balança deitado na rede e assim permanece como lócus que estuda essa nova militância cibernética mais estática que guaxinim morto, tal qual os adoradores de arrobas e arrombas que arribam o Estado e arrebentam com o povo que não sabe que é pelo seu bem, pois nunca leu Gramsci e se leu deve está tendo uma visão errada, pouco dialética, muito sectária, tal qual o outro filósofo, intelectual orgânico, Amado Batista cantou: “sectária que trabalha o dia inteiro comigo...”.

Mas deixemos de tantos entretantos e vamos colocar a jiripoca pra piar neste terreno arenoso de lobos mais mansos que cordeiros, de Edsons Cordeiros desafinados e de Lobões anarco-fascistas incompreendidos. O tempo é de dormir e ter pesadelos. Pois depois de dois mais dois pudemos destilar e fermentar pensamentos que garantiam a firmeza da decisão de patentear as formas-de-fazer-babau, de confeccionar o dicionário de siglas do Serviço Social e de ministrar um curso de como pelegar sem perder a ternura.

É tanta carta e manifesto, tanto erro de português e de concordância (e de discordância também) que o contrário do contrário do contrário não virou tese, nem antítese, muito menos síntese. Dadaísmo e dedalismo em atos terroristas com bolinhas de papel à alvejarem pobres dráculas tucanóides, Vandinhas esverdeadas com a bíblia na mão, envergonhando a Família Adams, agora em versão Greenpeace; além de vovós militantes históricas, velhas demais para um tango, quiçá para um rock. Ambidestros mutantes se proliferavam sob o discurso da petulância e do embasamento, deveras assaz, de Pedro Bial e Paulo Henrique Amorim, alastrando a onda de maisoumenozação dos bares prosaicos de esquina.

E assim percebíamos os termos e a merda de não termos uma esquerda mais eficiente que a do Ronaldo Angelim e chorarmos e rirmos nos micro-blogs, redes sociais, alpendres e cabarés da vida. E de tanto julgarem e falarem e dizerem e discursarem demais nada mais diziam. Nem pneu de caminhão, nem jegue, nem greve, nem nada, tudo estava no Estado Ampliado, menos os nossos defeitos. Mas não era o fim, era o começo.

Se desmantelo é que nem bunda e só presta grande, que o produto fecal desse processo adube a mente, desmantele a máquina e deixe tontos todos àqueles que quiserem excesso de racionalismo e quantificação. Que possa lombrar as desculpas esfarrapadas e lustrar o pau das caras-de-pau que enfurecerem e enrijecessem de tanto saco puxar.

Alquimia, nós só estamos chegando. Aqui o que vale é o anarco-color-dada-endo-ego-auto-marxismo-anti-cristão. Profanação! Profanação! Destilamos sarcasmo para o torpor dos desequilibrados e queiram, por favor, tacarem vossas cabeças nas paredes e morrerem caso não queiram ouvir. Andem pela sombra e usem filtro solar. Que Beto Barbosa esteja conosco! Bêbados e de pé estamos. Nunca calados, mesmo falando do nada, sobre nada e pra ninguém. Aqui, o critério não é você.

sábado, 26 de março de 2011

Primeiro Manifesto Mómintiriano: “Evite acidentes, faça de propósito” - Ano 2008



A Mó Mintíra Píctures é uma entidade sem fins lucrativos que esconde em seu âmago o desejo imensurável e plenamente possível de dominar o mundo através do recurso imagético, aliado a uma boa fundamentação teórica resultando em um pseudo-anarco-socialismo-falconiano que visa disseminar a lógica de que a “besteira é a base da sabedoria” entendendo que “uma coisa é um padre um menino e um jegue e outra coisa é um pneu de caminhão”.

Nascida em um encontro cósmico e etílico no Santa Madre Cassino entre Raul Seixas, Adolfo Bezerra de Menezes, Falcão, Dragão-do-mar, Joel Santana, Gramsci, Karl Marx, Palhaço Carequinha, Juca Chaves, Freud, Seu Madruga, Paulo Freire e Cirilo da novela Carrossel, a Mó Mintíra Pictures inicia sua jornada de sucesso dentro do maravilhoso mundo da academia quando a síntese transcendental dos pensamentos mais escalafobéticos desses abnegados, vivos ou não, burros ou inteligentes, chegam as mentes de dois jovens do curso de Serviço Social na Universidade Estadual do Ceará.

A partir daí começa a dura batalha contra o mal, tomando como inspiração a de vida mártires que eram sexy e usavam vermelho, como por exemplo Che Guevara e Chapolin Colorado. Crescendo espetacularmente, protagonizando inúmeros episódios deveras importantes, indispensáveis, essenciais para toda a humanidade, a Mó Mintíra Pictures invade a Uece produzindo um trash sobre filosofia moderna, intervém nas eleições para reitor com cobertura dos principais jornais da cidade, lançando candidato próprio, entra no meio futebolístico e arrisca-se de vez no maravilhoso mundo hollywoodiano com um documentário que frustrou os espectadores pelo baixo nível de putaria, e com um curta marcante na overdose de esculhambação com um certo pensador de esquerda, resultando na justa fama recheada de competência, prepotência e excesso de gostosura. Entre idas e vindas o conglomerado anti-empresarial sofre com a precarização do trabalho e os impactos da reestruturação produtiva e assim como “Sandy e Junior” diminui o seu quadro de funcionários temporariamente, ou não, para se expandir, pois havia chegado a hora de membros traírem o movimento punk. Agora, um coletivo de um homem só, fala do nada, sobre nada e para ninguém. 

Os seguidores momintirianos se espalham pelo mundo defendendo os alfaces, a dialética, a cachaça, os caranguejos do Himalaia e esculhambando Jorge Vercilo! Eles gritam “toca Raul!” nas óperas, dançam funk nos simpósios, ouvem Bezerra da Silva, Chico Science, Benito de Paula, Garotos Podres, Matanza, Marcelo Yuka, Cordel do Fogo Encantado, Amado Batista, Sabotage, Tom Zé, Belchior, Cidadão Instigado, Led Zepellin, Jumenta Parida e Babau do Pandeiro. Proliferam os ideais por meio de performances como a dança do papagaio, disparam asneiras e revelam a bipolaridade emocional indo do mais autêntico besteirol até a indignação sincera com as mazelas sociais existentes. 

Trabalhando coletivamente, agora o único membro da organização, busca reunir-se consigo mesmo em momentos de pura reflexão epistemológica que vão do ócio criativo à vagabundagem extrema, a fim de aprimorar o método de construção do conhecimento que ganha cada vez mais ares altos e poluídos. Assim, em períodos enriquecedores, com encontros regados a boa música do RBD e muito suco de framboesa, a Mó Mintíra Pictures funde arte, ciências sociais, militância e diversão num só espaço, relativizando cada vez mais o “mais ou menos” e achando que uma sociedade semi-quásica jamais poderá nos permitir a felicidade plena, isto é, uma terra onde todos comam bem e, principalmente, bebam bem. Entre as tensões contraditórias, as pitadas de dadaísmo, os trocadilhos infames, o chão do materialismo e o agarrado com o surrealismo, esta corporação às avessas tem absoluta certeza que o que é sólido desmancha no ar e que os cacos no chão podem ser mais dignos que o Caco Antibes e para não dizer que não falamos das flores o nome científico da rosa vermelha é rosa gallica.

Acreditamos então, de forma inexorável, em diretrizes éticas e políticas que chegam à noção que companheiro “é meu ovo esquerdo”, diluindo a burrice mal-humorada e arcaica que está arraigada em setores de alguns “estagnamentos sociais”. A Mó Mintíra Pictures ampara as causas de que toda pessoa tem direito de fazer oito cadeiras no semestre, estagiar, participar de grupos de pesquisa e ainda ter tempo para dormir, beber, militar e namorar, ou simplesmente deixar todas as atividades de lado e ficar apenas com as últimas citadas. 

A organização está comprometida na defesa do pão e da poesia e na crença que o ódio e o amor não são opostos e sim irmãos e que, portanto, estão presentes em todos os coraçõezinhos (até nos dos Pinheiros cardíacos). Busca em sua luta contra a extinção do ideário revolucionário nos corações e mentes da classe trabalhadora, bem como contra o desaparecimento da espécie das chinchilas albinas de uma pata só que vivem no sudoeste africano, perceber que a criatividade é uma das maiores armas da humanidade, que o humor é uma munição implacável para a ampliação da disputa de consciência e que o recurso audiovisual é um dos canais mais diretos na contemporaneidade, que se não utilizados por nós companheiros revolucionários ultra-jovens, será cada vez mais apropriado pela liga da injustiça formada por Dunga, Roberto Marinho, Flora, Nazaré, Papa Chico Bento e todos os vilõezinhos de Malhação na defesa do capital, do machismo, da homofobia, do Padre Marcelo, dos Teletubies, do Calcinha Preta, entre outros absurdos.

Assim, convidamos todos e todas para dormirmos de dia e vivermos a noite! Vamos à luta camaradas, a revolução será televisionada! Ao vivo, sem muita resolução de imagem e direto das ruas (em ruas que tenham bares)... E no dia do juízo final, estaremos todos lá, cantando inebriados por Vodka Natasha, improvisando palavras de baixo calão, disseminando a lógica do “bom é quando faz mal”. E quando o conselho dos Justos se reunir com Marx, Tiririca, Ronaldo Angelim, Falcão e Jimmy, eles estenderão uma faixa que estará escrito: “Evite acidentes, faça de propósito!”.



*Texto escrito em 2008. Você encontrará vários videos da Mó Mintíra Pictures por aí pelo mêi do mundo.

quarta-feira, 23 de março de 2011

Lâminas


Não escrevo porque quero
Pois eu quero muito mais
Quero poemas vividos
E com vida por demais
Reluzentes, inquietos
Por justiça, amor e paz

As palavras são navalhas
Escrevo como aliás
Deveria me compor
Numa tinta cor lilás
Espalhando-se sem temor
Cortando poréns e mas

O verso que hoje corto
Sozinho não satisfaz
Não escrevo porque quero
Pois eu quero muito mais
Não construo o poema
O poema é que me faz

Wescley P.

terça-feira, 22 de março de 2011

Ares e eu


E na guerra da terra
As balas
Enterram as flores
Nas valas
Do caos

E em seu epitáfio
Um verso
Disperso
Imerso

Fatal.
Wescley P.

segunda-feira, 21 de março de 2011

Flores de Urucum

Contra a máquina
A mente
Contra as facas
Os Dentes

Contra a fé
As crenças
Contra a morte
As Doenças

Contra o liquido
A firmeza
Contra a mentira
A certeza

Contra o contra
O contra-ataque
Contra o medo
O combate

E brotando em "um mais um"
Vejo As Flores
Versando no Campo e nos campos
Contra as dores

Da soma de choros,  de sonhos
E amores
Da luta que não cede
Do contra que não perde

A sede de nossas belas cores

Wescley P.

terça-feira, 15 de março de 2011

A Primeira Pessoa

Eu era a primeira pessoa. Uma pessoa sozinha, uma só pessoa que vivia sua singularidade achando que podia falar de Nós, por Nós e para Nós.

Eu queria fazer tudo para que Nós desse certo. Então Eu buscava tomar todas as atitudes para facilitar o caminho de Nós. Eu pensava por Nós, comia por Nós, cantava por Nós...

O problema era que Eu não percebia que Nós era muito maior que Eu. Nós precisava de algo muito mais que Eu e Eu não poderia fazer nada sozinho que fosse realmente bom e relevante para Nós.

Eu queria tanto ajudar Nós que na verdade só pensava em si mesmo. E enquanto Nós vivia, construía, conquistava, Eu só enxergava a si mesmo e dizia “Eu faço, Eu posso, Eu consigo”.

Eu estava só. Eu era sempre e somente só. Eu era a pessoa mais egoísta do mundo. A primeira pessoa do singular.

Wescley  P.

sábado, 12 de março de 2011

Fetichismo


Preciso fazer um poema
Preciso fazer um soneto
Preciso de quatorzes belos versos
Preciso de dois quartetos
Preciso de dois tercetos
Preciso de versos decassílabos
Preciso de um poema preciso.

Mentira, não preciso não!

                                                                                                                       Wescley P.

sexta-feira, 4 de março de 2011

A peleja de Lukács contra Habermas*



Meu senhor, minha senhora
Escute o que vou falar
Pois eu venho lhes contar
Uma importante história
A peleja de Lukács
Que estudando Karl Marx
Colocou tudo pra fora

Colocou tudo pra fora
O que tinha na cabeça
Pois um tal, metido a besta
Tinha aparecido agora
É que Habermas foi à luta
Questionando a conduta
De Lukács nessa hora

Injustiça como essa
Merece reparação
Pois relativização
Que Habermas faz quando versa
Não responde as perguntas
E o tema que se junta
Carece menos de pressa

Foi aí que decidi
Botar os dois cara a cara
Pra ver se você repara
A prosa que eu também vi
Com narração parcial
Pois nesse jogo real
Meu lado já escolhi

A disputa é cruel
São dois intelectuais
Respeitados por demais
Escrevendo no papel
Na plateia marxistas
E também pós-modernistas
Vi Lessa, Macário, Castel...

Deixando papo de lado
Vamos logo pro enredo
Que eu já tô é com medo
De um sair baleado
A briga já está feia
Vai sair um mói de pêia
Do burguês com o dominado

“O central tá no trabalho?”
É o tema da peleja
E vamos botar na mesa
Todas cartas do baralho
Vendo o cerne da questão
Mostrando a contradição
Do capitalismo falho

Lukács, o nosso artista
Discursou nesse momento
Colocou seus argumentos
Não escorregou na pista
E Habermas observava
E o que não concordava
Anotava numa lista

“Falo da centralidade
Do trabalho, com razão
Pois a prévia-ideação
Vira materialidade
É essa a ontologia
Que junta teleologia
Com as tais causalidades

A natureza mudando
É esse o meu trabalho
Mas não sou nenhum paspalho
Eu faço tudo pensando
Isso não é casual
Eu sou um ser social
Porque vivo trabalhando

É esse o meu trabalho
Ele é transformação
Muda a mim e a produção
Muda a tu, muda o cascalho
Muda o jeito de pensar
Muda o se relacionar
E diz até quanto eu valho

Você deve tá confuso
Pensando no pós-moderno
Escrevendo em seu caderno
Esse seu olhar difuso
Falando em novidade
Em nova sociedade
Esquece o valor de uso

Muito bonito você
Metido a filosofia
Escrevendo agonias
Sem ao menos saber ler
Sem ver a realidade
E toda a fragilidade
De quem só vive a sofrer

Se você não entendeu
Vou deixar bem explicado
O trabalho, abestado,
É fundante, compreendeu?
Mas com a divisão de classe
É que gera o impasse:
‘Dois pra tu e um pra eu’

Amigo, a própria historia
É minha prova maior
E nisso não estou só
Comigo até tu concorda
No hoje é que o bicho pega
E aí tu escorrega
E passa a roer a corda...”

Habermas se levantou
E disse “ ultrapassado!
Tu já ta é aluado
Ainda não se mancou
Ficou parado no tempo
Analisou um momento
Não viu que o mundo mudou

E a tecnologia?
E a crise de valores?
E esses novos atores
Da vida no dia-dia?
É preciso analisar
O novo relacionar
Longe da ideologia

O mercado financeiro
Nova face social
Nova vida, no geral
O salário, o dinheiro
Não pode ser encarado
Como no século passado
Com viés politiqueiro

“Com viés politiqueiro?!”
Respondeu o marxista
Você só quer ser artista
Se safando no puleiro
As suas afirmações
São as mesmas contradições
Com o jeito mais faceiro

Não venha com esse lero
Desmerecendo o trabalho
Passei na casca do alho
O bom senso que acelero
Conversa neoliberal
Não aceitou nem a pau
Nem é isso que eu espero”


“É aí o seu engano”
O Habermas ironizou
“Você não analisou
O novo cotidiano
Não viu a identidade
Intersubjetividade
Hoje é primeiro plano

É que a comunicação
Hoje é centro de tudo
E deixe de ser queixudo
Olhe pra informação
Não fique nessa demência
Perceba que a ciência
Faz parte da produção”

“Você é muito é insano”
Falou Lukács atrevido
“Tá na hora do bandido
Sair debaixo dos panos
O seu miolo de pote
Não consegue dá um norte
Pro bem do gênero humano

Falo com honestidade
O que eu quero falar
Temos que priorizar
Nossa coletividade
Não nego o individuo
Mas só com ele, não lido
Essa é minha verdade

Trabalho é protagonista
E traz possibilidade
De prisão, de liberdade
De tudo que hoje exista
É chave do entendimento
Por isso fica no centro
E por favor não insista


‘Intersubjetividade’?
Êta palavrinha grande
Assim a prosa se expande
Num verso só ela cabe
Na minha terra é migué
Pro povo perder fé
Na nossa historicidade”

Sem ter muito o que falar
O Habermas saiu do salto
E foi gritando bem alto
Como quem vai apelar
Esquecendo a humildade
Falando barbaridade
Que dá vergonha contar

“Não aceito discutir
Com teórico tão gentalha
Com sua resenha falha
Que não dá nem pra sair
Agarrado num barbudo
Fingindo saber de tudo
Mas longe de descobrir

Tenho pena de você
Caro Lukács maldito
Você deve está aflito
Porque não sabe perder
Uma derrota merecida
Com teoria vencida
Ninguém lembra de te ler

Hoje sou o maioral
Estou na crista da onda
Todo mundo já me sonda
Me chama de genial
Escrevo sobre o individuo
O meu leitor é assíduo
É ‘comunicacional”


Lukács disse “atenção
Eu sou um pesquisador
E escrevo com louvor
Não admito ilusão
Sua falha não engana
E se eu buscasse fama
Ia dançar no Faustão

Quero muito conversar
Mas de forma interessante
Não perder nem um instante
Com bobagem e com penar
Se você não quer conversa
Me diga logo depressa
E é melhor se calar”

O Habermas já sem razão
Esculhambou o Lukács
Xingou a mãe de Karl Marx
Saiu rodando no chão
Mas isso o pior não foi
Foi o que disse depois
Preste muita atenção:

“Eu estou perdendo tempo
Tempo sem necessidade
Com uma personalidade
Sem esmero, sem talento
Só quem te ler animal
É o Serviço Social
E os cabeças-de-vento

Falar de centralidade
Sobre esse tal de trabalho
É coisa de salafrário
Ou não passa de maldade
Tu és mesmo um indigente
Escrevendo feito gente
Pras moças de caridade


Aí o bicho pegou
Lukács pediu reforço
Lessa não roeu o osso
Macário logo engrossou
Pularam da arquibancada
Pra ajudar o camarada
Foi quando o tempo fechou

E Habermas na agonia
Se encontrava em apuros
“Esse daqui tá seguro”
Macário e Lessa diziam
Agarrando o oponente
Lukács todo contente
Batia com alegria

Da arquibancada ouvia
“Bate logo nesse bicho!”
Era Evânia, que no grito
Se juntar também queria
Virgínia gritava “verme!”
Ao lado de Guilherme
Protestava em companhia

Professora Adnarir
Junto com Zé Paulo Netto
Quase que não param quietos
Os dois sem parar de rir
Liana disse 'meu povo
O circo vai pegar fogo
Ninguém sai vivo daqui!”

Pense na pisa pesada
Que esse pobre levou
Quando Lukács cansou
Macário, com mão inchada
Disse que ainda havia
Como tirar mais-valia
Em sangue, dando porrada!


Na plateia o Castel
Foi saindo de finim
Disse “se pensarem em mim
Vou sentir gosto de fel
No meio desse embolado
Vai sobrar pra todo lado
E vou acabar no céu”

Foi quando o escorraçado
Pediu calma a multidão
Se levantando do chão
Tava todo envergonhado
Falando como um doente
De forma surpreendente
Mudou o tom do riscado

“Eu agora me escafedo
Digo estou indo embora
Mas você se engana agora
Se pensar que estou com medo
Eu fiquei foi convencido
Do meu erro cometido
E estou pedindo arrego

Acabem o empurra-empurra
Eu fiquei sem argumento
Murro até que aguento
Mas não minha postura burra
O tapa bateu na face
Mas a pisa no debate
Foi pior do que a surra

Eita que esse povo é brabo!
Onde eu fui me meter?
Não pude nem defender
A tese que eu me gabo
Fui querer entra na festa
Agora o que me resta
É só abanar meu rabo


Portanto deixo vocês
Fiquem com sua conduta
Com as classes, com a disputa
Do jeito que Marx fez
Não há como discutir
E é melhor eu sair
E deixar tudo de vez

De lado deixo a vaidade
Contigo eu aprendi
Em sua fala percebi
Que você tem validade
Não estudar quem trabalha
Essa foi a minha falha
Não vi a centralidade”

Lukács interrompeu
Falou como vencedor
Disse “grande pensador
Quem lhe ganhou não fui eu
Quem ganha é a academia
Criando bibliografias
E todo o povo venceu

Homem deixe de besteira
Tu não tá de todo errado
Tem muitos pontos cruzados
Entre as nossas papeleiras
Devemos dialogar
Para podermos chegar
A uma tese primeira

Que tu é equivocado
Isso todos podem ver
Mas aprendi com você
Olhar o subjetivado
Vem comigo pelejar
E do trabalho falar
Contra outro alienado”


O Lukács pra acabar
Convidou toda a patota
A discutir anedotas
Todos na mesa do bar
Pois Meszáros e Antunes
Já esperavam imunes
De tanta pinga tomar

Assim acabou o conto
Uma grande brincadeira
Disputa nada ligeira
Eu peço até um desconto
Todos aqui são da paz
Brigar de vera jamais
Não esse o confronto

A disputa de verdade
É na ponta da caneta
Tese ,papel, lápis, letra
Pela tal centralidade
Aqui tudo é ficção
Mas nossa grande questão
Está na realidade

É nela que a gente cria
Força e concentração
Planejamento e ação
Numa contra-hegemonia
Firmeza nos pensamentos
Embasando os argumentos
Na luta do dia-dia

O marxismo venceu
No final dessa peleja
Mas o que ele deseja
É vencer o capitalismo
Dialogando os autores
Mas sem perder os valores
E cair no subjetivismo


O trabalho é central
Não há como discutir
E eu não vou nem mentir
O Habermas é mêi sem sal
Agradeço a atenção
Pois já é ocasião
De botar ponto final

Me despeço de vocês
Como Karl Marx falou
Pedindo ao trabalhador
União contra o burguês
Já deixei o meu recado
E eu já tô é cansado
Até a próxima vez!

[Pois já deu o meu horário
Essa era minha meta
Levar vocês na conversa
Na lábia ninguém é páreo
Agora vou descansar
A nota comemorar
Com um dez no seminário.]

Wescley P.


Cordel feito para um seminário sobre o livro Os Sentidos do Trabalho, na disciplina de "Serviço Social e Processo de Trabalho", no curso de Serviço social, da UECE, ano de 2008.