terça-feira, 29 de março de 2016

Nascente

Como quem sabe
Como quem duvida
Caminho um passo
E suspiro outro
Sabendo que há muito nesse vazio
E pouco naqueles excessos

Nado de braçadas
Contra a correnteza
Não para exercitar
Mas por saber que no nascente
A água é cristalina
E a vista é mais bonita

O caminho é árduo
Braço-a-braço
No raso caminho um passo
E transpiro dois
E quando canso
Como quem sabe
Como quem duvida
Respiro a brisa da boa fé
Um sopro de calma
No olho do furacão

quarta-feira, 16 de março de 2016

A Pedra

No bico do sapato tinha uma pedra
Naquela vitrine tinha uma pedra
Tinha uma pedra no meu rim
De tantas pedras sobre mim
Foi quando caminhei sozinho
Que descobri que eu era uma
Para alguém e o seu caminho 

Marca

Massagearam o punhal nas cortinas da distância
O sangue saiu da lâmina, beijou o seu tecido
Fincando a cor e a carne de outrora
Como uma estampa de estanque

Invisível aos olhos
Longe de tudo e de todos
O corte permaneceu
Onde não se esconde a dor
Nem o orgulho do erro

Toda costura deixa marcas

segunda-feira, 14 de março de 2016

Laços

Multiplico os poucos
E aos poucos me mostro
Não sei o motivo da pressa
Ou da fala que não cessa
Se não sou de risos frouxos
Mas de sorrisos abertos

Gosto do sussurrar do canto
Do encanto do pouco
Do cochichado e do assobio
Não do barulho vazio
Mas do silêncio nas canções

Quando o excesso é elogio
Nos descaminhos que crio
Prefiro o som de um rio
E dispenso as multidões

quinta-feira, 10 de março de 2016

Coração

Por ser semente de amor
Mesmo banhada por lágrimas
Na infértil terra do tempo
Brotou-se uma flor
No coração da ferida

Onde hoje é pura seca
Há de existir vida

Penumbra

Taciturno
Oco opaco
Tece o muro
No fiapo

Puro trapo
Parto rusgo
Rasgando a forma

E o conteúdo

quinta-feira, 3 de março de 2016

Vespertino

Dessas tardes largas
Desse tempo rude
Fica o desejo
De que o mundo mudo
Mude

Entreato

O vácuo alimentava a mente
E amortecia sua morada
Coração dormente
Incapaz de olhar ao lado
Ali vomitava palavras
Com gostinho de prazer
E incapazes de revelar
A estranha sensação
De estranhamento pleno

Naquele buraco
Nunca se falou tanto em liberdade
Enquanto prendia a si mesma
Naquele vácuo cheio de nadas
Vivia escrava de suas vontades
Onde não há eternidade
Onde a mente crescia
E o coração apequeneva
Para sempre

Miragem

Querendo viver as coisas
Esqueceu-se das pessoas
E elas são importantes
Querendo viver das coisas
Encheu-se de vazios
Para voar pelo mundo

Flutuar impreciso e fluido
Sob um céu de ilusões
E sobre um chão de mágoas

Sinceras

quarta-feira, 2 de março de 2016

Subtexto

Daquelas palavras subterrâneas
Que guardam segredos, maldições e mágoas
 E caminham pelos esgotos espalhando
A irresponsabilidade com a mensagem
Naquelas palavras subterrâneas
O emissor regozija, o receptor apetece
E o resto é vilipendiado pelo aroma
Do egoísmo e da traição

Malditas sejam essas palavras
Podres e falsas, capazes de fingir realidades
De mirarem aparências e forjarem laços
Que só existem no escuro
Onde a verdade não chega
Nem o peso do cuidado
Com o outro